sábado, agosto 26, 2006
Morphine - Cure for Pain

Prometemos meia dúzia de absurdos quando nos conhecemos. Nos primeiros dez minutos, combinamos uma viagem ao redor do mundo. Nos vinte minutos seguintes, falamos sobre o bairro em que gostaríamos de morar quando casássemos. Após uma hora, pensávamos nas crianças brincando perto da horta que cultivaríamos com carinho. Foi então que saímos correndo daquele café, embrulhamos nossos corpos ensandecidos em lençóis alugados e nunca mais nos vimos. Nunca mais. Alguns grandes amores duram apenas um período de três horas no motel mais próximo, simplesmente porque é o suficiente. Se fosse de outro jeito, talvez deixasse de ser um grande amor.

Mas, ainda assim, é bom que se diga que foi mais profundo que centenas de outras experiências que talvez vocês julguem maiores. Mais profundo que qualquer sentimento que exista entre os casais que passeiam de mãos dadas como zumbis pelos corredores dos shoppings. Não existiam amarras, e quando elas não existem, você pode mergulhar sem calcular a profundidade. Quando colocamos os pés naquele quarto, ele olhou sem desvio nos meus olhos e perguntou:

- Você se sente livre para dirigir um filme, cantar uma música ou escrever um livro?

Era a deixa perfeita para lançar Morphine no player. Cure for Pain, de 1993, nasceu para manipular por novas vias as estruturas do rock tradicional. Ainda que Good, lançado no ano anterior, já apresentasse a essência do que era o tal Morphine – uma banda de rock sem guitarras, mas com um inusitado sax no lugar das cordas barulhentas -, foi com Cure for Pain que Mark Sandman e companhia firmaram-se como uma das bandas mais inventivas da década de 90 – quiçá de todos os tempos.

- Se você se chamasse Candy, eu gostaria de ter escrito esta música para você.

O disco que começa com a breve e instrumental Dawna caminha para Buena ainda com uma sonoridade pouco comum, mas já na segunda faixa começa a seduzir inevitavelmente – talvez pela incrível e suave voz de Sandman, ou ainda pelos sons insólitos que explodem da quase minimalista banda. Aos poucos as canções ganham corpo e saltam sozinhas pelo ar. I´m Free Now - a dona do verso sobre liberdade citado acima – é absolutamente perfeita. Mas chega de análises, pois não é preciso fazer um faixa-a-faixa de Cure for Pain: ele anda com as próprias pernas, como se fosse soberano em um universo paralelo onde não existem guitar bands. Antes de seguir adiante, no entanto, é importante citar Candy, uma bela canção de amor nada convencional. O mundo continua precisando de canções de amor, afinal.

- Mas... Se você não se chama Candy, qual é mesmo o seu nome?

Os amores perfeitos são assim. Não se apegam às pequenas convenções da vida – como guitarras ou nomes próprios, por exemplo.

cotação: ****
para saborear Candy e I´m Free Now, clique aqui.

escrito por Nat || 26.8.06 ||

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1 Comments:
At quinta-feira, 02 abril, 2009, Blogger Leandro Leal said...

Oi, Natasja. Vi um comentário (apagado) seu num texto antigo do meu blog e, por curiosidade, resolvi clicar no seu nome. Aí, vi seu blog, que, pela falta de atualização, deve estar desativado... Gostei. Gostei desse post sobre "Cure For Pain", um disco que gosto deveras. Disse tudo.
Voltem a escrever. O blog é (era) bom.

Beijo.

 

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