terça-feira, fevereiro 13, 2007
Stereophonics - You Gotta Go There To Come Back

O que de fato me agradava em Londres era aquele clima soturno, beirando ao melancólico, e a atmosfera neo-conservadora das pessoas, que se modernizavam e se adequavam aos costumes da moda, mas jamais deixavam de ser londrinos. O sotaque carregado (sim, aos habituados com o inglês americano, a língua-pátria dos europeus beira ao caipira), um requinte muito semelhante aos paulistas do Mercado Municipal, da Moóca, os Juventinos e afins. De qualquer forma, um povo adorável até mesmo no seu azedume.

Eu nunca estive em Londres. Muito menos havia conversado com um londrino, ou visto uma foto que não fosse em revistas de viagem ou pela internet. E que me chamem louco então, que não me importo. Nunca me reconheci com os ritmos daqui, ou esse humor exacerbado, ou ainda com a falta de entremeios e delicadezas que possibilitam destinguir um sir de um cidadão comum. Me admira sim essa elegância, e o que há de fino. E não estou falando do chá das 5, e sim desse requinte da postura, dessa melancolia áspera e do tempo nublado.

Passagens para a terra da Rainha sempre me são enviadas via Beatles, e mais recentemente via Oasis - que sim, considero uma banda bem honesta e que bebe na melhor das fontes. Porém, um trio do país de Gales chamado Stereophonics fornece passagens para a ilha ao mesmo preço, e com um tempero local de deixar qualquer um de queixo caído.

O álbum You Gotta Go There To Come Back de 2003 traz exatamente esse sabor. Talvez porque a banda de Kelly Jones tenha mixado o cd nos estúdios em Abbey Road, ou ainda porque antes disso em Since I Told You It's Over - única faixa gravada nos estúdios dos Besouros, e provavelmente a mais melancólica do disco - sinta-se claramente o que descrevi logo acima. Dos discos anteriores (Word Gets Around de 1997 e Performances and Cocktails, de 1999) nota-se que existe um pouco mais de alegria e menos identidade na música dos rapazes. Algumas pérolas e muito potencial, que se evidencia nos discos seguintes: em Just Enough Education to Perform (2001), e o nosso You Gotta Go There... temos uma banda com experiência de estrada e personalidade, além de mixagens mais caprichadas e "sujas", agora condizentes ao seu estilo, e com o lugar de onde vêm.

Fato é que You Gotta Go There... é um discásso. Passeia pelos raros dias de sol do Velho Continente (Raibows And Pots Of Gold), mas logo encontra a paisagem nebulosa da falta de controle (Help Me), de saudade e despedida (I Miss You Now e Since I Told You It's Over), inveja (Jealousy), entre tantas amarguras. Mas em um disco aparentemente choroso - aos que desconhecem o som dos rapazes, reencontra-se a luz em territórios conhecidos (despedida (Nothing Precious At All) e Maybe Tomorrow) e até mesmo um bom humor quase cafajeste (You Stole My Money Honey). E a mistura desses temas tão cotidianos e reais acaba resultando na experiência à qual o disco oferece em seu título.

Portanto, caso queira conhecer um pouco da ilha britânica além-Beatles, uma boa pedida é pegar um expresso até o País de Gales, e de lá partir de olhos fechados e ouvidos abertos à essa experiência estereofônica. Entre o luxo e o lixo desse lugar cuja temperatura não ultrapassa 20ºC, e onde o rock pode sim ser rotulado de "bom e velho", não se sinta mal em pedir mais dois dedos de whiskey durante a viagem. Afinal, você precisa ir até lá para poder voltar.

cotação: ****
para saborear Since I Told You It's Over e Help Me, clique aqui.

escrito por Eddie Cooper || 13.2.07 ||

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